Torna-se já um hábito, para os que vão estando mais atentos ao desenrolar da vida e dos acontecimentos, comentar o progressivo apagamento cultural das tradições, das datas e das memórias. É nos momentos de especial significado que se torna mais patente esta "limpeza" civilizacional, que nos leva a esquecer a história e o sentido das coisas e das personalidades. O que construímos durante séculos, o que celebrámos e vivemos outrora, vai-se transformando em vazio de conteúdos, em pasta informe de gestos e ritos, que destroem pela raiz o fundo cultural em que nos movemos. Quase sempre, o lugar da substituição é ditado pela moda, pelo consumismo e pela ausência de reflexão que dita quase todos os passos do nosso stress de viver.
Nos últimos anos, algumas vozes bradam no deserto, chamando a atenção para os valores fundamentais da festa do Natal, para o perigo do materialismo dominante apagar a imagem do que realmente interessa. Parece que o perigo passou, ultrapassado pela própria realidade. O Natal não tem já qualquer sentido de "nascimento", de menino, de paz ou de simplicidade e ternura. Em vez de nascimento, tem compras. Em vez de menino, tem velho de barbas brancas. Em vez de paz, tem barulho frenético de campanhas de pseudo-solidariedade em competição, não pela dádiva da nossa ternura, mas por mais compras, mais mediatismo e mais euros. Como se tudo se resumisse a isso...
Querem uma prova? Nas duas festas de Natal de que fazemos reportagem nestas páginas, as palavras "Jesus" ou "menino" não foram pronunciadas uma única vez. Minto: na Golpilheira, um grupo de senhoras pós-60 anos foi cantar músicas de Natal.
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